domingo, 23 de junho de 2019









Ventos de outras eras 

Aqui sentada na invulgar quietude da minha alma, suspiro prosas de outras eras. 
Valorizadas por alguns e esquecidas por muitos, até mesmo por mim.
Relembro aquela criança arrebatada de sonhos gigantes e de amores impossíveis. Cheia de emoções, um pouco sombria e muito intensa.

Ah! Como lembro daquela impaciência de querer tudo já e agora. De querer viver histórias que não me pertenciam mas que as sonhava e as idolatrava incansavelmente.

Não estavam ao meu alcance! Não era aquela a minha hora.
Lembro da escrita ser um porto seguro. Um refúgio onde a minha alma e o meu corpo desmantelavam-se sem ninguém saber. 
Esse momento era só meu! Meu e de mais ninguém. 
Sinto falta desse tempo! Não de estar só e apedrejada. Não de estar quebrada em pedaços. Nao é isso que anseio! Anseio sim a intensidade das noites onde a caneta não parava e o sopro era devorado e preenchido de tudo e nada. 

Hoje falei com um amigo que nas suas breves palavras descuida o segredo que no seu refúgio encontrou a desejada utopia e que essa na rotina não paira. 
Confesso! Invejei-o por horas. 
Inveja de olhos entusiasmados e de sorrisos rasgados. Inveja de cantar bem alto o sentido de uma paixão. 
Senti vontade de fazer o mesmo. 
E curiosamente aqui estou. De volta a uma folha de papel qualquer acompanhada por uma caneta galopante e sorriso estampado. 
Curioso pensar que este ser (hoje mulher) forte e complexa encontra nas palavras a inocente pureza da felicidade. 
Estou feliz por agora, mas não prometo voltar. 
Pois foram nestas mesmas profundezas de tudo que de repente também encontrei o nada. 

Diana Veloso 

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

INQUIETUDE

      

      No silêncio desta noite ténue, sorrisos incandescentes tímidos familiarizam-se com um manto desnudo e frio que paira sobre esta brisa. Neste cenário, a minha pele clara estremece lembranças de um passado penoso e inquietante; E aos meus olhos, chegam imagens de todos os tempos! Acarretadas com dúvidas de quem não obteve respostas às insistentes que perduraram em momentos de outrora (sem tu as soubesses. E sem que tu as saibas!) 

      Acredito eu, que não as deves a mais ninguém! (Assim como também eu não as devo, senão a ti). Eramos crianças frágeis e indeterminadas que se baloiçaram sobre as utopias que, inconscientemente, se atropelaram num final inconstante e inacabado (Talvez também ele não desejado!). 

      Nesta noite, imagino-me sentada na ‘‘sarjeta’’ (designada aqui como uma desvalorização do tempo e do lugar, porém de sentimento inconstante idêntico) onde este coração débil insiste em olhar para as estrelas que ali pairam; Como se com isso eu pudesse atenuar, perigosamente, esta fatalidade de ainda recordar marés vagueadas pelo tempo de tentação permanente! 

      Não se trata de um prazer meu de o continuar a fazer! A ilusão é que toma partido dos meus sentimentos e eu não consigo enredar por outros trilhos, mesmo que a vontade fosse ou seja a de partir...Sei lá eu! Creio que, a única que coisa que ainda sustenta todos estes turbilhões, seja esta minha consciência ausente despida de dúvidas que anseiam por uma nova vestimenta. Não ambiciono uma biografia da sucedido, até porque isso seria emprestar à ‘’sarjeta’’ uma nova inquietude onde se debruçar. Não. Não quero mais isso! Apenas quero tentar entender a razão pela qual as duas metades se apunhalaram sem se aperceber. 

 Apenas isso… 

 Espero que me oiças, pois eu não sou suficiente para encontrar a resposta!... 

  DIANA VELOSO

domingo, 1 de janeiro de 2012

Pestanejar de Pálpebras



Hoje pela manhã, mesmo antes de pestanejar pela primeira vez as minhas pálpebras,
já pensei em ti sem sequer ter sonhado contigo.

O dia já desperta lá fora! Repleto de luz! E eu, tenho em mente os teus lábios carnudos e meu rosto debruçado no teu peito perfumado.

Ah! Como quero! Como quero acordar assim...
Com essa tua presença luminosa logo pela aurora,
com esses teus olhos serenos despertando preguiçosos sobre uma qualquer almofada partilhada por ambos...
Ah! Como quero! Como quero sentir a tua alma pura, despida, diante de mim!
Querer acreditar que é possível parar todas aquelas horas felizes que vivemos em tórrida paixão que arde como fogueira de muitos ventos outrora desprezados.

Todas as noites, enamoro o crepúsculo da noite através de uma janela fechada.
Desajeitada, alinhada por rectângulos horizontais e distante desse teu cheiro!
Sabes, (risos) imagino-te ao meu lado.
Imagino que irás acordar a meu lado, com esses teus olhos lunares observando-me descaradamente e acariciando-me o rosto...
E os meus? Esses, coitados! Despertam vagarosamente recebendo todo o brilho dessa manhã de ternuras frescas e de pulsares verdes.
Ficaria horas, se me deixassem... pintando cada cena que passo contigo! Mas, rapidamente surge sem convite nuvens de consciência que tomam o comando de todo aquele pensamento e me mostram que não é assim! Que o único convite de todas aquelas noites quentes e húmidas nas quais não estou contigo, é a quietude de meu quarto vazio!
E nessa quietude...nessa quietude, volto a adormecer e a acordar sem ti!

Chega dessa quietude escuro que me alucina!
Convido-te! Anda!
De forma desajeitada, empurro-te à pressa para meus braços...
Não suporto ficar tão longe!
Agarra essas pernas e dá passos repetidos sem parar!
ANDA!!!!!!!!!!!!! ANDA!!!!!!!!!!!!!!!
Prometo-te abraços longos, colos de sonho e beijos em brasa!
Anda, estou à tua espera...
----
De repente, enquanto os meus dedos ritmados trabalham insaciavelmente sem parar, oiço o murmuro baixo de uma voz grossa e pouco rouca: ''Estou aqui! Estou aqui ao teu lado!''

DIANA VELOSO
15.09.2011

terça-feira, 17 de maio de 2011

ENCONTRO DE DOIS CORPOS NA MADRUGADA


(DIANA VELOSO:)
Escorreram os veios da ansiedade por um corpo delineado num mar de quatro cantos. Sentiu-se desejo tremulo a contorcer na voz que vinha de longe...
Entre provocações escritas e respirares de desejo, a espuma ia-se instalando ...nas beiras da chávena quente de café e a colher mexendo-se incansavelmente em movimentos repetidos...!
Foi esta uma viagem de cerimónia, em que o traje resumia-se á pele nua fervendo dançando entre as ondas inventadas!...Em que a barreira das fronteiras foi um estimulo para continuar, em que a vontade foi para sonhar mesmo em tempo de maré baixa!

(Ele:)
''O olhar fixo na espuma do café sob o sol que tornara-se frio em comparação ao gosto quente que invadiu a boca e contornou os lábios: espuma tomando o espaço dos vapores que são avisos de possíveis erupções; a espuma em torno na chávena e o repentino desejo de sorver cada gota de café como se fosse o último de uma vida. A colher raspando a borda da chávena em círculos, afundando milímetro por milímetro até tocar levemente a superfície e fingir que desiste só para recomeçar muitas vezes, cada vez permitindo-se aprofundar mais um pouco. A vontade e a sensação quente aumentando, a colher coberta da espuma que transbordou e colou por todos os lados e cada vez mais espuma sendo produzida pelos mesmos movimentos ritmados da colher que mergulha e vem à tona muitas vezes até que a última gota finalmente é sorvida como quem mata a sede de um deserto.''

(DIANA VELSO:)
Sede saciada temporariamente no gosto de café que ainda perdura na boca...
A vontade de repetir todos os movimentos, de sugar toda a espuma, de aprofundar o sabor, de sentir a transpiração... Suar só em pensar!E alimentar-se de provas e amarras de tudo o que a geografia ensinou naquela noite! (Como quero ser conscientemente ignorante para assistir a mais uma aula!)
A água transbordava no momento, o mar estava cheio de desejos e vontades era imprescindível a presença para o nível da água regularizar, para a sede disfarçadamente acalmar...
Movimento Cíclico prendido no som das ondas do mar...
Voltamos a encher a chávena de café e voltamos a baloiçar e sobrevoar a colher de aço ritmada!... (sedes insaciáveis!)

(''Ele'':'')
A lua de olhares maldosos e pronta a aplicar torturas naquele que estava sob a sua luz (raios que incidem sobre o branco da felina estendido sobre as falsas, mas eficazes, ondas do mar de quatro cantos). O vinho a brotar das montanhas e a descer precipícios, atravessando planícies, descendo seus afluentes para encharcar as fendas de uma geografia sinuosa e repleta de misteriosos caminhos. O gosto dos calores subterrâneos chegando à superfície, a aquosidade delicada e consistente que faz com que a presa escorregue, não por acidente, mas por causa do magnetismo e vontade incontrolável. Uma mistura indissociável de mãos, peles, suores e rumores. A geografia sendo explicada nos mínimos detalhes, o guia a levar pela mão a aprendiz para que sejam descritos todos os acidentes da paisagem: acidentes sobre acidentes, a sede que não sacia mesmo que a boca afoita prove e clame por mais do que beber.

(DIANA VELOSO:)
Colisão das maiores catástrofes naturais que alguma vez eu imaginara observar... Eram vulcões aos vómitos, eram furacões rugindo, eram tsunami de vontades espalhados pelos cantos do desejo que fervilhava naqueles dois corpos nus á mercê um do outro! A violência dos astros conspirando para não terminar, mesmo sabendo que seria apenas temporariamente...
A delicadeza da pele? Já não existia!... Era uma pele branca manchada de vermelho vivo e tatuada por unhas cravadas em cada poro exposto á vontade...
Entre turista e guia a diferença não era notada, ambos trabalhavam ardentemente na exploração daquela sede. Ambos sabiam que depois de entrar no sonho, o acesso à porta do regresso seria difícil (ou até mesmo impossível) de alcançar!

Diana Veloso & José Roldão

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

PORTA ENTREABERTA (Escritos intemporais)


(Ele - 17/5 às 15:28)
Ela saiu para ver a chuva e deixou a porta aberta. Puxou de um cigarro e ficou à frente de casa com os olhos cinzas fixos nas gotas que tocavam uma canção na calçada. Passam-se horas e densidades de chuva enquanto ela permanece ali e um indivíduo, que estava do outro lado da rua a ouvir a mesma canção, faz movimentos com as mãos na fumaça de seu próprio cigarro e apodera-se do vento num ato mágico. Não foi sem maldade nos lábios que soprou uma mensagem que chegasse ao outro lado da rua.
Ela havia deixado a porta entreaberta e foi de assalto que ele entrou no prédio, subiu os degraus e atravessou o santuário daquela alma. Ela vinha envolta na mesma fumaça do cigarro e trazia os cabelos molhados. Deixava para trás rios de chuva pelo chão. Deitaram-se no sofá da sala e ela cantou muitas canções para ele enquanto riscava com o seu dedo estrelas cadentes no fumo de ambos. Choveu a noite inteira. E parecia uma chuva de séculos.

(Diana Veloso - 17/5 às 15:37)
Ela cantou até sua voz ficar rouca, cantou para ele todas as canções que conhecia. Ele, parado admirando a prosa dos seus lábios e acariciando-lhe o mesmo cabelo molhado trazido da chuva de outrora.
O cabelo foi secando, a fala enfraquecendo e os olhos dela foram ao encontro do rosto dele despedindo-se com um beijo e ingenuamente dizendo-lhe: ''Posso deitar em teu peito?''

(Ele - 17/5 às 15:44)
Ele não respondeu, simplesmente pôs os dedos nos labirintos do cabelo dela e levemente a trouxe para si, encostando-a ao seu peito. Fez-lhe delicados carinhos naqueles labirintos e depois, quando já sentia a pele branca e ainda molhada da chuva arrepiar-se, levantou-a e sussurrou-lhe ao ouvido: "Dá-me um raio, que dou-te o som do trovão". Os olhos dela pareciam uma tempestade.

(Diana Veloso- 17/5 às 15:54)
Suas taças inundadas já pelo sentimento que lhe corria nas veias, respondeu baixinho (e ainda de voz rouca): ''Não precisas de me dar um trovão, tu já me trouxeste a tempestade...'' Encostou fortemente a sua face no peito nu acom-panhada por lágrimas despedidas de felicidade.
Sem o dizer, apenas comentou para a sua alma: ''o tempo podia parar aqui''

(Ele - 17/5 às 16:08)
O relógio invisível do tempo obedeceu às suas ordens secretas. Com o dedo ele riscava o trajecto de cada lágrima sobre o corpo e foi carregado através da correnteza dos veios de chuva que transbordavam daquelas taças. Em seguida inundou os lábios ao beijar os dois olhos dela e sentiu o gosto frio e inebriante da sua pele. Pensou para si mesmo: "Todos os tempos de uma só vez nestes olhos: uma eternidade de silêncio e o mundo não existe mais". Lá fora, a chuva acendeu seus raios e lançou seus trovões a ecoarem, não se sabe se pelo mundo ou pela casa.

(Diana Veloso - 17/5 às 16:20)
Ela, com o coração em chama desenhava com as suas lágrimas o mapa dos dedos dele...
De olhos fechados para o relógio, começou a beber insaciantemente aquele momento e numa atitude de louca come-çou a molhar-se na sua própria chuva...
Ele, surpreso responde: ''Que estás a fazer?''
Ela sorrindo diz: ''Sentido o que deixaste à porta do meu santuário''

(Ele - 17/5 às 16:51)
Ele, surpreso e ao mesmo tempo ansioso por provar a chuva que caíra à porta do santuário, passa a testar a densidade da pele que tinha a sua frente: montes e vales, rios e vulcões, poesias escritas nos poros e canções que ao invés de notas são tremores. O caminho que chega à porta do santuário não é longo, mas ele prefere marcar passo-a-passo aquelas extensões e por vezes deita-se para ouvir o pulsar daquele solo. Quanto mais se aproxima do santuário, mais forte é o pulsar daquele mundo que desbrava. Torna-se cada vez mais difícil manter-se de pé, tamanha a chuva que cai e junta-se ao solo já húmido. Depois de tentar prolongar ao máximo possível aquele trajecto, deixa-se correr até à porta do santuário. Ao chegar ali, já com a respiração na velocidade do pulsar daquela pele que desbrava, diz ao vento: "Estou pronto para entrar no abismo". Em seguida, abre a porta do santuário e entra, tocando cada parte molhada pela chuva. Raios e trovões ensurdecem aos dois e tremores balançam as fundações da terra.

(Diana Veloso - 17/5 às 18:41)
Ela, escutando o som de cada passo pisado na sua chuva treme de ansiedade momentânea... Consciente do sonho, desta vez deixa a porta do seu santuário aberta para que ele a descubra envolvida nas melodias de suas prosas. Com um ar de gozo, abre bruscamente os seus olhos de felino somente para apreciar a vulnerabilidade da sua presa! Essa, motivo das suas poesias, afasta-se da chuva com receio, mas ao mesmo tempo podia-se notar de longe a vontade daquele animal de voltar para os seus braços. O felino, o mais temido no sonho disfarça a timidez de partilhar o mesmo desejo numa gargalhada de eco infinito. Por breves momentos, o som ouvia-se longe! Apenas o som da gota que caia no chão...Tinham sido eles, gélidos corpos imóveis no chão que fizeram com que o relógio para-se. Duas almas apenas vestidas com abraços da madrugada.

(Ele - 17/5 às 19:09)
Ele acordou na calçada sem a noção das horas. O corpo encharcado e a respiração ofegante, mas não conseguia entender porque estava ali, na calçada do outro lado da rua. Passou a mão molhada pelos cabelos e a sua visão ainda ficou por alguns momentos confusa: seria por causa da chuva que continuava a cair no seu rosto ou por conta dos sonhos tão reais que ainda corriam sobre sua pele? Ela já não estava do outro lado da rua. Por instantes pensou vê-la fechando as cortinas das janelas no primeiro andar do prédio, como se estivesse à espreita, esperando que ele acor-dasse (voltasse a si?), mas não soube dizer se a tinha visto mesmo ou se era ainda algum vestígio do sonho que teve. Sentou na calçada e jogou o cabelo para trás. Foi quando olhou para o chão ao seu lado e encontrou um desenho seu em grafite, mas no desenho ele tinha asas coloridas. Olhou para o desenho mais alguns instantes e olhou para a janela do apartamento do outro lado da rua. Deu um sorriso de lado, levantou-se e seguiu o seu caminho. Depois daquele sonho, já não sabia ao certo para onde ir...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Absortas sem sentido!




Corpo pousado sobre a berma da estrada, remexido nas asas do tempo.
Estancado! Morta e mole na brisa apodrecida!
Mais uma vez, viajei nos sonhos de oportunidade;
Mais uma vez, pedra fortificada no caminho ficou;
O seu medo não a deixa abrir os portões blindados, nem penetrar no espaço para outra época.
O silêncio era mais antigo. Silêncio de outras eras de dor!
E, as coisas eram custosamente visíveis á luz decrepita.
Ao simples impulso da voz, vi o alojamento na desordem,
Abandonei as armas interrompidas pelo pânico e atravessei uma das grades de ferro da alma.

Apaixonavam-me ventos trazidos do horizonte,
Embalaram-me canções de tom baixo e rouco de uma voz indefinida!
Espelhos de alma a corpo inteiro, infiéis ao tempo dos cometas.

Passei momentos de inocência e sabedoria de outras eras,
Ficavam a palpitar nas coisas que, secretamente desejavam fazer.
Ficou por ali, os sorrisos, os sonhos, as palavras, os gestos!
Estagnaram simplesmente no tempo!
E, aqui estou eu nesta madrugada que não lembra a ninguém,
Onde a precariedade do que somos dá lugar ao murmúrio eterno!
De olhos tristes, os lábios pálidos gélidos pela brisa, a mão pensativa que ia dizendo "adeuses" a ninguém.

Cega ambulante, que involuntariamente ia recitando versos de poetas esquecidos que ninguém valoriza.
Apenas a menina deitada sobre o manto azul do céu,
Ouvindo o seu próprio ruído humano e suspiros de felina por detrás das paredes fortificadas invencíveis e inegáveis.

Várias vezes pensei que viriam revoadas sucessivas do horizonte do mar.
Várias vezes pensei ver a poeira voando o dia todo em forma de círculos lentos,
Destroçando e evitando correntes de água suja.
(Pensei eu!)
Que cumpria-se assim, sem margem para erro, sem pausa, sem fechar a porta a um novo capitulo,
Entregava as tréguas daquele momento sagrado, onde as vozes extinguiam-se, sem respirar!
Apenas ouvia aquele batimento cardíaco assemelhado ao de uma criança que se ia tornando mais profundo à medida que a maré subia.
Até a cúpula da noite calma aquietava o vento, transbordando toda aquela emoção à face da terra flutuada na água lunar!

Suplico sempre por um rumo diferente,
Mas descubro, da forma mais dolorosa, que ninguém alimenta ilusões enquanto não se apagam as luzes.
Não deveria ter apagado a minha quando pediste!
Observar novamente os sonhos de naufraga solitária tornou-me mais mediativa e mais sombria.
Deixei de dar atenção para aquilo que me diziam,
Comecei a dormir no chão, vestida, sem almofada!
Renunciei à procura, que outrora era insaciável, da descoberta precorce da identidade.

Inquietar uma ilusão, não seria o caminho.
As cifras do meu destino estão escritas algures, perdidas entre as marés mais ferozes!
Não posso, embora fosse o meu desejo,
Desenhar o meu percurso em pequenos pedaços de papel escrito,
Suportando tantos sonhos que não dependem só de mim!
Acabam por se juntar, apenas aos suspiros reprimidos de ilusões impossíveis.
Sem as tocar! E tão efémeras e tão inantingivéis!
Aprendo a confortar-me com o destino rafeiro.
Talvez um, que não seja meu!

Quero guardar, é certo!
Queria dar asas à história, mas não basta o meu querer!
Aquela confusão de identidades atingiu o seu auge numa tarde de ventos cumpridos.
Não sabia como comportar-me!
De tanto tempo que o coração ficou fechado ao sentimento de entrega,
Encontrei como forma de alívio, à pressa e com o escudo ainda vestido
Guardar interiormente todas as imagens nocturnas que, por descuido, faziam-me tropeçar por pedras ocultas!
Aos olhos do outro, poderia ser desinteresse e podia consolar-se assim de que fora não mais do que um sonho a noite do cometa.
E a magia de um rosto envelhecendo gradualmente apenas num dos corações.
Não! Não compreendes os porquês de todas aquelas barreiras!
A noite, aquela que me pertence em sossego,
Espero por encontros sem resposta, espio por sinais e canto sem que ninguém me oiça.

Repara como estou triste, sentada naquela escada com lágrima colada na pele clara do meu rosto!
Já não posso com o mundo,
Que a minha vontade era de partir sei lá eu para onde!
Renego-me, apesar de querer partir, à distância em quilómetros.
Pois não é resposta para suportar à magoa!
É impossível mestrar o próprio interior.
Os suspiros regressam à lembrança com as primeiras luzes da noite, assaltando todas as defesas.
No entanto, para ele esse luar já não era verdade.
Para ele, enganaram-o por hábito, mentiram-lhe por medo, que nada era genuíno naquela crise de incerteza que, os poucos, estava a amargar-lhe a glória e tirava-lhe a antiga vontade de sonhar!
Coração, nunca foi essa a minha vontade!
Sempre acreditei que poderia ser real a utopia, que era capaz de ouvir ao longe, o mar longínquo, o ruído das rosas que se abriam ao amanhecer, o suspiro sem querer!
Pressentindo-o com um instinto bravio a iminência da tarde que regressava sempre à lembrança.
Nessa tarde, ao contrário do que esperávamos!
Decorreram muitas horas de prudência, de averiguação sigilosa, de convivência secreta que não partilhava por medo de quebrar-me em pedaços cruelmente pequenos.
Optei por jogar na defesa de mim mesma e, talvez tenha errado ao fazê-lo... Mas sou eu!
As palavras, são mais fáceis de suportar e entendê-las!
Talvez, nesse momento fiquei bloqueada pois não via nas tuas o mesmo que, verdadeiramente as minhas transmitiam.
Como é que para ti, o sol tinha nascido e tinha voltado a nascer sem sequer tropeçar?
Porquê o mesmo calor, ainda que sem mim?
São perguntas que me assombram, que me ferem pelo horror e pela vergonha do meu próprio corpo de mulher.

Novamente, de cara lavada pelo pó da areia, os lábios pintados de vermelho vivo e as duras mãos de menina impáveis sobre o peitoral blindado de falsas medalhas de guerra.
Absorta, sem sentido! Dobrei um dos meus braços servindo-me de almofada.
Adormeci, por instantes, mais só do que nunca,
Embalada pela dança incansável das árvores como corpos fumegantes sobre as luas coloridas, agora senhoras do massacre!
Tentei distinguir-me entre a ferocidade do desejo e a vontade do dever.
E designando, segundo os impulsos da imaginação, tentei restaurar as forças e dissipar o remorso daquelas inquietações prometendo que todas aquelas torturas de amor fossem as últimas em território felino.
Pode parecer cruel, até desumano esta negação ao sentimento.
Mas ninguém para além de mim própria conhece o que é ser torturada (mesmo que inconscientente) por alguém!
É horrível voltar a acreditar ou antecipar um futuro com uma lembrança apenas mágica
Enquanto que, sem reparar, era possível continuar a torturar-me (em pensamento!) órgão por órgão sem me matar ao mesmo tempo que tentava arrastar-me em busca de novas formulas.

Torcida em convulsões, onde o vestígio inspirado pelo amor foi sequestrado no dia em que fechei os olhos para a emoção.
É a minha forma de refúgio, viver sobre esta paisagem sem horizonte de áspero pó lunar, cujo as estrelas sem fundamento doíam na alma desta estranha menina de origem incerta, que a complexidade da sua alma tinha sido um escândalo para alguns fanáticos disfarçados na noite da fortuna.
Quando na realidade, ninguém ouvia o meu ofegar nem as minhas lágrimas solitárias que escorriam contornadas à medida que ia anoitecendo, como que apodrecendo de desgosto.
Aquele desgosto de escassez não era eterno, havia de durar até que as forças de ocupação abandonaram o coração afim de cumprir os termos de desembarque.
Separando todos os momentos numerados e colocando-os em gavetas arrumadas,
Onde essas memórias eram acompanhadas pelo fantasma perdido na tempestade acreditando que consigo levaria todo o paraíso de guerras e a permissão de voos de cometas!

À medida que escrevo todas estas quedas sobre as palavras, as horas passam e torno-me mais tensa e sanguínea do que é natural.
Levanto-me de repente, com alguma dificuldade numa pausa.
Mesmo assim não consigo deixar de observar que em instantes os alicerces do que eram foram abalados com a explosão compacta de todas as armas disparadas ao mesmo tempo.
Uma vez, sem ruído intermédio, sem um lamento. E outra vez, e pronto... Acabou!
A donzela, nem sequer estremeceu.
Ficou apenas uma atmosfera de pólvora no silêncio do mundo.
Ficou apenas ele a salvo para sempre da inquietação.
Foi a minha escolha, renunciar à busca de instantes apenas vi-o a desfilar sobre as chuvas, afastando-me cada vez mais!
E, de olhos propensos ás lágrimas dispus-me a terminar a tinta da caneta nesta história, porque pareceu-me inútil contrariar.

Passo noites sem dormir para não recordar.
A noite tornou-se tão áspera que tremia a ideia de encontrar apenas as pessoas em sonhos!
Quero acreditar que não, para não dar o prazer de matar-me novamente sem direito algum.
Abandonei esta minha inocência prematura, esqueci as mendigadas palavras de amor que quero ouvir!
Senti vergonha do meu estado, repassei os sítios com as mãos amarradas ao coração para que os remendos não se soltassem.
Tento agora, pela primeira vez resistir aos instintos de amante fugaz e ignoro suspiros de outros.
Estou farta de saber que aquela vontade eram ilusões que alimentava para mim mesma,
Que cada salto na minha solidão, cada tropeço da minha respiração aproximavam-me do esquecimento das súplicas por amor.

Pensando bem, todo o mundo não passa de bonecos com mecanismos ocultos e virtudes humanas.
Na realidade, a maioria não sente a intensidade do cometa como eu o sinto!
Alguns ignoram e outra grande parte suplicam aos astrónomos que inventem uma luz brilhante que fosse suficientemente aterrorizante para causar uma vertigem de eternidade.

Não! Eu vejo e intensifico esse momento!
Não o suplico apenas deixo-me perdida para sempre no enigma do eclipse!
Agora, voltarei a fechar-me para o estremecimento,
Voltarei a ser a menina de mim mesma!

DIANA VELOSO